Por algum tempo o crack ficou restrito aos guetos das grandes cidades. Atingindo principalmente adolescentes pobres, aumentando tanto os índices de criminalidade quanto a crueldade e banalidade dos atos infracionais praticados. O preço da vida, para um dependente em abstinência, pode ser o preço de uma dose. Pouco tempo atrás, em Porto Alegre, a crônica policial noticiou o assassinato de um rapaz por sua mãe. 24 anos, filho único, loiro, classe média alta, viciado em crack e histórico com mais de 10 internações, além de condenações policiais por pequenos furtos e longa lista de agressões a familiares e conhecidos.
A disseminação desta nova droga, ao sair da favela e invadir bairros nobres provocou na sociedade uma “comoção” diferente de antes. O rapaz loiro, classe alta, assassinado pela mãe, ganhou notoriedade, chocou o estado e foi notícia nacional. Mas qualquer breve pesquisa nos leva a dezenas de casos similares anteriores, de rapazes e moças, só que nem tão loiros, e em e vilas populares, a maioria com bem menos que 24 anos, assassinados por pais ou mães, abandonados, sem moradia, sem escola, sem leitos para tratamento, sem perspectiva nenhuma maior do que a morte próxima.
Seria demais pensar nas centenas ou milhares de jovens adolescentes viciados em crack que morrem todos os dias e sequer fazem parte das estatísticas? De crianças que hoje já são dependentes? De crianças geradas por mães usuárias, e todas as complicações decorrentes? Seria paranóia esquerdista pensarmos no crack como política de extermínio para esta incômoda parcela excedente da população? Afinal, para eles faltam vagas em quase tudo... escolas, trabalho, assistência médica e social, lazer, profissionalização. E isto tudo tem um alto
custo social, e particular, refletido nas grades, na segurança privada, nos presídios lotados. É a falência do deus mercado gerindo a sociedade.
O faturamento da indústria farmacêutica mundial em 2007 atingiu a cifra de 300 bilhões dólares, e esta área é justamente uma das que mais recebe investimentos para pesquisa. Qual a dificuldade, então, para que sejam desenvolvidos medicamentos de combate à dependência química? Quais as terapias que realmente funcionam, no combate à dependência? O que dizer das “fazendas” terapêuticas, dirigidas por religiosos sem formação médica, em regime quase militar? O que fazer, então, uma vez que, sabidamente, a rede pública comprovadamente não consegue suprir a demanda?
Pelo que dizem médicos e especialistas em drogadição, ela não tem cura, tem apenas controle e estagnação, com acompanhamento e tratamento. Isto relacionado a maioria das drogas, excluindo-se delas o crack nos estágios finais. Então: O que fazer com esta parcela de já usuários crônicos? Como impedir que mais e mais jovens sejam usados pelo sistema através de suas drogas lícitas e ilícitas, atrás de uma perspectiva ilusória de vida? Sim, por que o crack hoje é epidêmico, mas novas drogas são criadas a cada momento, dependendo da
rentabilidade, da perspectiva do consumo e do uso que pode ser feito delas.
Parece repetitivo. Cansativo. Mas a resposta, repetida cansativamente, e infelizmente não ouvida, salta aos olhos e não é vista: enquanto o capitalismo for o sistema dominante, serão estas e outras agruras a alimentar os sonhos de parte de nossa juventude, e a anestesiar o que bem poderiam ser as dores da revolta de toda uma civilização amordaçada.